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25 de Abril de 2024

Bancos são responsáveis pelo protesto de duplicatas frias, decide o Tribunal de Justiça do Paraná

O acórdão também reconheceu a inexigibilidade dos títulos protestados, porquanto, além da falta de comprovação acerca dos elementos essenciais dos títulos em questão, militam em favor do autor, fortes evidências de que as duplicatas, de fato, não possuíam lastro em negócio jurídico regular, tendo em conta que o requerido não juntou nenhuma documentação...

há 7 anos

A culpa capaz de ensejar a responsabilidade da instituição financeira, embora não expressamente contemplada na Súmula 476, é elemento pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, inclusive, integrando os precedentes orientadores de referida Súmula. Foi com este entendimento que o Tribunal de Justiça do Paraná condenou o Banco Bradesco ao pagamento de indenização por danos morais a um agricultor da Região Metropolitana de Curitiba, em ação que antes tramitou no Fórum Regional do Município de Fazenda Rio Grande, em processo físico, desde o mês de junho de 2011.

Trata-se de Apelação Cível interposta em face de sentença que extinguiu o processo sem resolução de mérito, com fundamento no artigo 485, inciso VI, do CPC de 2015, em razão da ilegitimidade passiva do réu. Inconformado, o autor interpôs o recurso requerendo, em síntese, o reconhecimento da responsabilidade do banco na condição de endossatário-mandatário e a consequente legitimidade do mesmo para ocupar o polo passivo da lide, condenando-o ao pagamento de danos morais e materiais em razão do protesto de títulos inexistentes apontados em seu nome. O agricultor foi defendido pelo advogado Clediney Boeira da Silva.

Argumentou, o apelante, em apertada síntese:

i) A jurisprudência reconhece a responsabilidade solidária das instituições financeiras, nos casos em que o endossatário extrapola os poderes de mandatário ou em razão de ato culposo próprio, como no caso de apontamento depois da ciência acerca do pagamento anterior ou da falta de higidez da cártula;

ii) Os protestos foram realizados a partir de duplicatas frias, sem aceite nem apresentação de comprovante de entrega de mercadorias ou prestação de serviços;

iii) Mesmo após a inversão do ônus da prova deferida pelo Juízo a quo, o banco requerido não comprovou a existência de qualquer relação jurídica entre o autor e a empresa fraudulenta ou entre o autor e o banco réu;

iv) A sentença deixou de observar a regra prevista no artigo 489, inciso IV, do Código de Processo Civil em vigor, em deixando de responder, exaustivamente, a todos os argumentos invocados pela parte.

Brilhante acórdão, de autoria da magistrada Elizabeth de Fátima Nogueira, Juíza de Direito Substituta em 2.º Grau, decidiu que em se tratando de demanda de indenização fundada em protestos de duplicatas supostamente sem conteúdo econômico subjacente, e sendo a relação jurídica entre a instituição financeira requerida e a empresa que emitiu as duplicatas, caracterizada pelo endosso-mandato, inafastável é a aplicação do enunciado da Súmula 476 do Superior Tribunal de Justiça, que possui o seguinte teor:

"O endossatário de título de crédito por endosso-mandato só responde por danos decorrentes de protesto indevido se extrapolar os poderes de mandatário."

Com efeito, para que se possa responsabilizar a instituição financeira por eventuais danos decorrentes de protesto indevido, imprescindível a comprovação de que ela extrapolou os poderes que lhe foram conferidos por intermédio do instrumento de mandato ou, por outro lado, que agiu com culpa evidenciada diante das circunstâncias fáticas, como já pontuado pelo douto Juízo sentenciante.

“A instituição financeira não trouxe aos autos quaisquer documentos que comprovem a existência de negócio mercantil a ensejar a emissão dos referidos títulos, seja por meio de notas fiscais, seja por meio de comprovantes de entrega de mercadorias”, afirma o acórdão. “Ao contrário, a requerida postulou, em quatro oportunidades, pelo deferimento de prazo à juntada de documentação que comprovasse sua posição de mera mandatária em relação à empresa cedente dos títulos.”

O Juízo a quo inverteu os ônus da prova, ao fim de impor "ao requerido banco o dever de apresentar o título protestado, no prazo de 10 dias, improrrogável, posto que se aguarda tal providência desde novembro de 2015". Ao final, apenas em 23.05.16 (ou seja, mais de três anos após o primeiro requerimento de dilação de prazo), a requerida informou que, "em que pese as inúmeras diligências intentadas pelo réu, não foi possível localizar o documento solicitado por Vossa Excelência".

De se ver, portanto, que mesmo ausente a comprovação da relação jurídica subjacente às duplicatas, o Banco requerido levou os títulos a protesto, perfazendo a dívida total de R$ 6.813,00, conforme se vê das certidões positivas do 2.º e 3.º Ofícios de Protestos de Títulos e do Extrato Serasa. “Nesse aspecto, importante ponderar que, embora não se exija que o endossatário-mandatário investigue as condições do contrato originário, não lhe é dado efetuar protesto de título que evidentemente não possua lastro”.

E continua: “Portanto, em não tendo o requerido feito prova da relação jurídica que alega existir, ônus que lhe incumbia, em razão da inversão dos ônus da prova, resta configurada a negligência, haja vista que a instituição bancária assumiu a condição de mandatária para a cobrança de duplicatas, e encetou protestos em face do autor, sem a necessária aferição das condições mínimas para a exigibilidade dos títulos de crédito.

O acórdão também reconheceu a inexigibilidade dos títulos protestados, porquanto, além da falta de comprovação acerca dos elementos essenciais dos títulos em questão, militam em favor do autor, fortes evidências de que as duplicatas, de fato, não possuíam lastro em negócio jurídico regular, tendo em conta que o requerido não juntou nenhuma documentação referente ao título protestado, mesmo transcorridos mais de três anos para a realização de diligências.

“Tal inteligência é com efeito adequada, pois ao endossar duplicatas desprovidas de lastro e regularidade formal, a instituição financeira deu causa ao evento danoso, sendo evidente que, inexistindo tal circunstância, igualmente não haveria o protesto dos títulos que culminou com a inscrição indevida”, afirma. “A par dessas considerações, é de se reconhecer a inexigibilidade do título protestado, bem como o dever do requerido banco de indenizar o autor pelos danos decorrentes do protesto levado a efeito pela instituição financeira requerida, na qualidade de endossatária-mandatária.

Diante das circunstâncias, a 10ª Câmara Cível considerou que o ofendido é obrigado a suportar a transformação de sua dignidade (patrimônio imaterial) em pecúnia (patrimônio material). Não se trata de escolha (o que seria imoral, e certamente defeso pelo Direito), mas sim de coerção indiretamente realizada pelo próprio ofensor. Textualmente:

1) A reprimenda judicial deve refletir-se, pois, em verdadeiro desestímulo à continuidade dessas práticas contrárias ao necessário acautelamento do risco de a atividade causar danos a terceiros, de tal modo que a economia com a má prestação do serviço seja aniquilada.

2) Nesse viés, impende salientar que a conduta da ré foi grave, pois conta com recursos suficientes para adotar as cautelas necessárias a impedir que circunstâncias como essas (desorganização e ausência de controle efetivo sobre os negócios que resultaram em inscrição indevida) ocorram.

3) “Erros dessa natureza, de tão grosseiros, são inadmissíveis, mormente em virtude da alta capacidade tecnológica e humana posta à disposição desse tipo de instituição, enquanto o autor, por sua vez, é agricultor em regime de agricultura familiar” – conclui o acórdão.

Apelação Cível n.º 1.643.774-2

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